COP 28 e a transição justa

A pressão sobre setores intensivos em emissões de GEE ao longo dos debates na COP28 requer a compreensão do conceito denominado como “transição justa”. Além de estabelecer a meta de limitar o aquecimento global em 1,5ºC em relação aos níveis pré-industriais, o Acordo de Paris estabelece que isso seja feito com base em políticas que evitem o aumento da desigualdade social e impactos no mercado de trabalho.
Na definição da OIT (Organização Internacional do Trabalho), transição justa significa tornar a economia mais ecológica de forma que seja “tão justa e inclusiva quanto possível para todos os envolvidos, criando oportunidades de trabalho digno e não deixando ninguém para trás”.
E o mercado de capitais?
O setor financeiro é elemento fundamental na transição justa, porque pode fornecer capital e mecanismos eficientes de partilha de riscos. A incorporação do conceito nas operações envolvendo o mercado de capitais pode gerar resultados sociais e ambientais positivos, ao mesmo tempo em que minimiza potenciais consequências negativas, tais como ativos ociosos, perdas de emprego e declínio de economias locais.

No âmbito institucional, o cerco se fecha. A UNEP FI (Iniciativa Financeira do Programa Ambiental das Nações Unidas, na sigla em inglês) e a OIT lançaram o relatório Just Finance: Pathways for Banks and Insurance, com diretrizes para seus integrantes e para o setor financeiro em geral participarem na concretização de uma transição justa. Confira!
O BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento) e outros BMDs (Bancos Multilaterais de Desenvolvimento) publicaram um conjunto de princípios comuns para monitorar o financiamento positivo para a natureza. O objetivo é apoiar os BMDs na implementação de sistemas de triagem e rastreio que quantifiquem o volume de financiamento que está sendo direcionado a atividades positivas para a natureza, sejam atividades diretas ou indiretas.


FOTO: Divulgação COP28
A versão final do primeiro Balanço Global (Global Stocktake) apresentada na COP28 é resultado de uma difícil tarefa. Em meio a um cabo de guerra de interesses, buscou-se encontrar um meio termo entre “phase-out” (eliminação) e “phase-down” (redução) sobre o uso de combustíveis fósseis.
O phase-out é entendido como redução gradual da participação até a eliminação completa da matriz energética global até 2050. Já o phase-down é uma saída intermediária, também com redução gradual, mas com manutenção do uso de combustíveis fósseis após 2050. Eis o motivo para a controvérsia em torno da escolha dos Emirados Árabes Unidos, um dos maiores produtores de petróleo do mundo, como sede da conferência do clima.
A solução encontrada para o primeiro Balanço Global foi o "transition away from", em referência a uma transição para um possível cenário de eliminação. Em análise divulgada logo após o anúncio do Balanço Global, o Observatório do Clima considerou o termo um avanço por mencionar diretamente os combustíveis fósseis e a necessidade de substituição. Porém, deixa lacunas em questões práticas sobre prazos e recursos financeiros.
A expectativa é de que o Balanço Global cumpra o seu papel de orientar os países signatários em direção à meta de 1,5ºC. As atenções se voltam agora para a COP 30, que será realizada em Belém, no Brasil, quando os signatários apresentarão novos compromissos em suas NDCs. De preferência, com mais ambição.
O que diz o setor
Ainda no início da COP 28, um grupo de 118 países, incluindo o Brasil, se comprometeu a triplicar suas capacidades para energias renováveis até 2030. Outros 20 prometeram também triplicar a geração nuclear até 2050. O CEO da TotalEnergies, Patrick Pouyanne, declarou apoio ao compromisso e defendeu a necessidade de eliminação gradual dos combustíveis fósseis.
O executivo disse também que as tecnologias de captura e armazenamento de carbono ainda são muito caras e não são a solução para a descarbonização. O CEO da Exxon Mobil, Darren Woods, defendeu soluções para as emissões sem desperdiçar todos os investimentos que foram feitos em petróleo.
Ao relembrar que o Brasil sediará a COP 30, em 2025, o presidente da Petrobras, Jean Paul Prates, reafirmou metas para projetos de baixo carbono nos próximos anos. A companhia destinará US$ 11,5 bilhões para estes projetos, mais que o dobro do plano anterior. Até 2028, o investimento em baixo carbono deverá representar 11% do investimento total da Petrobras.
Os Estados Unidos anunciaram na COP 28 que divulgarão orientações sobre como os produtores de hidrogênio podem garantir bilhões de dólares em subsídios incorporados à Lei de Redução da Inflação.
O hidrogênio é um combustível de queima limpa que a administração de Joe Biden considera crucial para limpar indústrias difíceis de descarbonizar, como a do alumínio e a do cimento. Produzido a partir da eletrólise da água, o hidrogênio pode ser considerado verde se sua produção for alimentada por fontes de emissão zero, como solar, eólica, nuclear ou hidrelétrica.
Posição brasileira

FOTO: Fabio Rodrigues-Pozzebom/Agência Brasil
O Brasil levou para a COP 28 a posição de que os países desenvolvidos devem liderar as ações de redução do uso de combustíveis fósseis, para serem seguidos pelos demais. Em contrapartida, procurou demonstrar prioridade ao desenvolvimento de fontes renováveis.
A ministra da Ciência, Tecnologia e Inovação, Luciana Santos, anunciou o lançamento de cinco editais do programa Mais Inovação Brasil para financiar projetos nas áreas da transição energética, bioeconomia, infraestrutura e mobilidade. Os editais representam o investimento total de R$ 20,85 bilhões, sendo R$ 850 milhões em subvenção econômica.
O país foi alvo de críticas por aceitar o convite para integrar a OPEP+, grupo expandido da OPEP (Organização dos Países Produtores de Petróleo em inglês), que reúne os dez maiores países produtores do mundo. Os integrantes da OPEP+ não têm direito a voto na organização e são formados também por Rússia, México, Sudão e Sudão do Sul, entre outros países. O Brasil justificou a decisão como uma oportunidade para convencer as nações da OPEP+ a reduzirem a produção do poluente.
Descarbonização em pauta

A descarbonização do setor de óleo e gás foi tema de painel no Pavilhão Brasil, que contou com a participação do presidente da Petrobras, Jean-Paul Prates. Assista ao vídeo do debate.


FOTO: Divulgação COP28
Pela primeira vez, a COP teve um dia dedicado à agricultura. O setor enfrenta um dilema particular porque é um dos maiores emissores globais de GEE e, ao mesmo tempo, um dos mais impactados pelas mudanças climáticas.
Entre os anúncios mais significativos, esteve o do Fórum Econômico Mundial, que lançou a First Movers Coalition for Food, apoiada por mais de 20 parceiros do setor que buscam acelerar métodos e tecnologias e de produção sustentáveis para uma agricultura de baixo carbono. O Banco Mundial divulgou a decisão de investir US$ 100 bilhões no projeto AICCRA (Accelerating Impacts of CGIAR Climate Research for Africa) entre 2024 e 2025. O objetivo da iniciativa é impulsionar a agricultura de baixo carbono na região.
O Banco do Brasil, maior financiador do agronegócio no país, assinou um protocolo de intensões para a cooperação na identificação de iniciativas voltadas ao financiamento da sociobioeconomia e resiliência climática.
Marco temporal fica para depois
Pouco antes da COP 28, o Congresso anunciou o adiamento da análise dos vetos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva à lei sobre o marco temporal das terras indígenas. O texto acolhe a tese jurídica de que terras de povos originários podem ser demarcadas apenas se estiverem ocupadas por eles no dia 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição Federal.
Em entrevista à Environmental Finance, o estrategista sênior de soberania de mercados emergentes da BlueBay e copresidente do IPDD (Diálogo de Políticas de Investidores sobre Desmatamento), Graham Stock, disse que a legislação “anti-indígena” no Brasil é “um risco fiduciário para os investidores”. Na COP 28, o executivo alertou que a movimentação no Congresso é um retrocesso na proteção ambiental, uma vez que as comunidades indígenas desempenham o papel de guardiãs da terra natural.
Restauração florestal

O valor da floresta em pé foi tema de painel no Pavilhão Brasil que contou com a participação da ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, e do presidente do BNDES, Aloizo Mercadante. Assista ao vídeo do debate.

Os painéis que ocorreram no Pavilhão Brasil na COP 28 podem ser assistidos no site da Apex Brasil