As DAOs muito bem explicadas VIDEO
Felipe Palhares começa a conversa apresentando-se como “um ansioso profissional pelos problemas dos outros”. Em outras palavras, um advogado. Que tem um currículo invejável: entrou para a lista 40 under 40 conduzida pela Global Data Review em 2021, e faz parte dos rankings de melhores advogados de proteção de dados do Brasil da Chambers & Partners, Latin Lawyer, The Legal 500 e Leaders League.
Embora Palhares insista, e com razão, que hoje é impossível alguém afirmar que sabe tudo sobre DAOs (Organizações Autônomas Descentralizadas), porque se trata de um universo em formação e mudança, a entrevista faz um rasante importante sobre o assunto e se aprofunda nas potenciais vantagens e nos riscos conhecidos da sua adoção. Leia abaixo alguns trechos da conversa:
Entendendo o acrônimo
"DAO é um acrônimo que, em inglês, representa três palavras: Decentralized Autonomous Organizations. Se for resumir, estamos falando de um coletivo de pessoas, no qual as decisões são tomadas de forma descentralizada, sem a hierarquia tradicional das empresas do mundo físico, e cujas ações são reguladas pela tecnologia da blockchain.
Cada uma dessas palavras tem uma relevância para o conceito das DAOs. Começando por organizações, estamos falando de várias pessoas distintas que se agrupam em torno de um objetivo comum, e que podem nem ter uma estrutura jurídica formal por trás .
Quando falamos de autonomia, ela pode ser parcial ou completa (o algoritmo controla tudo). Mas a ideia central é que você não depende de um terceiro e que o código vai realizar automaticamente alguns procedimentos . Um exemplo simples: digamos que você defina no algoritmo que, toda vez que uma DAO financeira receba um valor de uma determinada carteira, ela vai distribuir esse valor entre todos os membros da DAO, e isso se faz de forma autônoma. Ela não depende mais de intervenção humana.
A ideia de descentralizado também traz vários aspectos. O primeiro deles está ligado à tecnologia de registro distribuído, que é a blockchain. Daí vem a descentralização, porque várias pessoas, vários computadores, guardam todas aquelas transações na blockchain. O outro aspecto, é que uma DAO não tem hierarquia. Não tem um CEO, não tem um CFO, não tem um presidente. O que temos são vários membros, que participam de forma descentralizada. Esses membros fazem propostas e votações, e as decisões são tomadas de forma descentralizada. O peso dos votos vai depender da governança que for estabelecida na criação da DAO."
Onde atuam as DAOs
"Já existe uma categorização de tipos específicos de DAOs de acordo com a aplicação. Talvez os mais famosos que a gente tem no mercado sejam DAOs de investimento, que nada mais são do que fundos de investimento nos quais várias pessoas aportam recursos e depois votam para decidir onde investir esse dinheiro - para comprar NFTs, ou para investir em startups, por exemplo.
Existem também DAOs sociais, como a Friends With Benefits, que apesar do nome curioso nada mais é do que um grupo de pessoas reunidas para discutir tecnologia, música, arte, NFTs, planejar e fazer eventos etc.
Esses são os tipos mais comuns, mas tem vários vários outros tipos de DAOs. No início da guerra da Ucrânia foi criada uma DAO específica para doações, na qual os membros decidiam para onde iria o dinheiro. Dá até para imaginar uma coisa assim feita para um programa filantrópico no Brasil, tipo “Criança Esperança”, na qual cada pessoa possa comprar um token de governança e decidir para qual instituição vai aquele dinheiro.
A gente espera ver no futuro ainda mais aplicações. A DAO não precisa ser para uma coisa única, pode ser uma DAO mista: que tem o aspecto de investimento mas também tem o aspecto de impacto social. Todos esses tipos são possíveis. "
A comunidade é a chave
“Um dos focos centrais das DAOs, como na Web3, é a ideia de comunidade. De nós criarmos um ambiente comunitário no qual nós somos os donos das informações e dos bens por trás dela. Uma DAO não funciona sem uma comunidade. Para fazer propostas, votar em propostas, você precisa ter uma comunidade razoavelmente ativa.”
Mas, e o aspecto jurídico?
“Você sabe que no mundo de DAOs a gente chama os advogados de “Legal Engineer”? Ou seja, um engenheiro jurídico. Aqui tem um aspecto muito relevante. Do ponto de vista pragmático, mesmo que o algoritmo regule a DAO, você inevitavelmente vai precisar ter alguém que conheça linguagem específica técnica e jurídica para conseguir programar aquele smart contract e, efetivamente, ter nele todas as funções necessárias para sua DAO.
Esse ponto inclusive é extremamente relevante e conversa muito com a questão da cybersecurity. Se você tiver um código que, por qualquer razão, foi feito de forma equivocada, ou que tem nele algum erro, algum bug, depois que você publica o smart contract na blockchain ele se torna imutável. E você só consegue mudar fazendo um novo smart contract, gravando na blockchain e convencendo as pessoas a mudar para ele.
Isso quer dizer que é preciso muita atenção na hora de fazer o smart contract, e a pessoa que for criar aquele contrato inteligente precisa conhecer muito bem a linguagem, precisa revisar, precisa fazer a auditoria daquele contrato. Não é um negócio simples.
E isso vale para os dois lados. Vale para quem está criando a DAO, mas também vale para quem quer participar dessa DAO. Os smart contracts são open source, portanto você pode ir lá e ver como o código está escrito. Claro que você precisa entender do código da linguagem de computação para saber exatamente o que acontece naquele contrato.
A partir do momento em que você quer participar desse mercado, talvez seja relevante você tentar procurar um pouco de informação, ao menos para ter uma visão mais ampla do que acontece especificamente no smart contract quando determinada função do algoritmo é executada."