Reorganização das forças mundiais é marcada por polarização política e enfraquecimento das democracias
Processo também se relaciona à pressão de movimentos migratórios e à maior influência econômica chinesaUm cenário marcado pela polarização política em diversos países está por trás não apenas da eleição de presidentes mais extremistas como Donald Trump e Jair Bolsonaro, mas também de um processo de reorganização das forças globais. É esta a visão do cientista político Ian Bremmer, fundador do Eurasia Group, que participou do 10º Congresso ANBIMA de Fundos de Investimento nesta quinta-feira, dia 25 em São Paulo. Ao descrever os movimentos envolvidos nesses fenômenos, Bremmer citou uma série de situações que levam os cidadãos a questionarem a legitimidade das instituições.
“Os casos de corrupção levam as pessoas a acharem que os políticos que estão no poder não se importam com elas. Nos Estados Unidos, este sentimento é maior também porque a renda do americano médio não cresce há muito tempo, mas os mercados seguem bem, ganhando muito e eles se questionam, afinal, por que manter tudo igual se só poucos ganham?”, disse o cientista político, citando movimentos globais contra o poder vigente – como Brexit, na Inglaterra, os coletes amarelos, na França, e o Movimento Cinco Estrelas, na Itália. “A sensação geral é de que as pessoas não são cuidadas pelo governo, o que favorece mudanças”, afirmou.
Para Ian Bremmer, não haverá mais G7, mas um G0 com cada país cada vez mais cuidando de si
Outro elemento central destacado nos argumentos de Ian Bremmer é a pressão dos movimentos migratórios. “Ninguém nos Estados Unidos quer mais a ideia de serem defensores do mundo. Gastos com guerras são muito impopulares, a mensagem agora é cuidem de mim”, por isso o discurso de Trump com o muro e de proteção comercial pegou tão bem”, disse. O último componente da análise é o fortalecimento das redes sociais como central nas eleições, o que reforça a polarização por meio de um discurso mais radical. “Nas grandes democracias, as instituições estão menos legítimas e mais fracas, favorecendo líderes extremistas tanto à direita quanto à esquerda, o que é estrutural”, opinou. Para reforçar seus argumentos, Bremmer lembrou os motivos de o Japão não refletir o fenômeno de radicalização: com a queda da população, a renda tem subido, além de que não há problemas migratórios e menos ainda gastos militares.
Em sua palestra, o cientista político pontuou que, por outro lado, a China se fortalece economicamente e tem seu próprio “Plano Marshal” ou “Belt and Road”, uma iniciativa de investimento que visa construir rotas comerciais na Ásia, Europa e África por meio de projetos de infraestrutura financiados pelo país. “Vários países ignoraram apelos americanos e se aproximaram da China, aceitando recursos do país em troca de elevar a rota de comércio”, disse.
É neste contexto, de democracias sob ameaça e com a China se fortalecendo, que Bremmer vê uma recessão geopolítica que levará a um reordenamento das lideranças globais. “Não será mais G7, mas um G0 com cada país cada vez mais cuidando de si”, previu. Ele acrescentou que só os Estados Unidos podem responder a esta tendência de um G0, mas, como hoje o país é menos afetado porque não recebe tantos refugiados, como a Europa, e tem ainda uma economia forte, não vê motivos para se mexer.